Perfil do país para a vida profissional em Portugal

Este perfil descreve as principais características da vida profissional em Portugal. Tem como objetivo fornecer as informações de base relevantes sobre as estruturas, instituições, atores e regulamentos relevantes relativos à vida profissional.

Tal inclui indicadores, dados e sistemas regulamentares sobre os seguintes aspetos: intervenientes e instituições, relações de trabalho coletivas e individuais, saúde e bem-estar, remuneração, tempo de trabalho, competências e formação, igualdade e não discriminação no trabalho. Os perfis são atualizados sistematicamente a cada dois anos.

Esta secção analisa a governação coletiva do trabalho e do emprego, centrando-se no sistema de negociação e nos níveis em que se insere, na percentagem de trabalhadores abrangidos pela negociação salarial, nos mecanismos de prorrogação e derrogação e noutros aspetos da vida profissional abordados nas convenções coletivas.

A preocupação central das relações de trabalho é a governança coletiva do trabalho e do emprego. Esta secção analisa a negociação coletiva em Portugal.

Os acordos coletivos são publicados no boletim oficial do MTSSS e são juridicamente vinculativos. Não existem acordos colectivos sobre salários na administração pública. O pico da crise económica e social em Portugal, em 2011-2013, combinado com a introdução de critérios mais rigorosos para prorrogar os acordos (2012 e 2014) que foram implementados ao abrigo do Memorando de Entendimento (2011-2014) resultou num colapso da negociação coletiva a todos os níveis – embora o maior impacto tenha sido sentido na negociação multiempregador a nível setorial – enquanto a descentralização pretendida não ocorreu. Embora o número de acordos de empresa em percentagem do total de acordos tenha aumentado, tal deveu-se mais à diminuição dos acordos sectoriais do que a um aumento das negociações entre as empresas. Em 2016, os acordos societários representaram 39,6% do total de acordos coletivos assinados, enquanto em 2018 representaram 44,5% e em 2021 representaram 52%. No entanto, entre 2016 e 2021, a proporção de trabalhadores abrangidos pelos acordos de empresa em vigor representou apenas 3,5% a 5,0% da cobertura da negociação coletiva (DGERT/MTSSS, 2022; GEP/MTSSS, 2022d; 2023).

Cobertura de negociação salarial

Globalmente, a cobertura das convenções coletivas em vigor diminuiu ligeiramente ao longo dos anos. A edição mais recente (2021) da pesquisa governamental Quadros de Pessoal constatou que a cobertura total de todos os acordos legalmente existentes para toda a economia (com exceção da administração pública) foi de 86,2%, em comparação com 91,4% em 2011. Esta 'taxa de cobertura acumulada' inclui um conjunto de acordos que não são revistos há muitos anos (DGERT/MTSSS, 2022; GEP/MTSSS, 2022d).

Na sequência das alterações jurídicas ao quadro jurídico da negociação coletiva, tal como exigido pela Comissão Europeia, pelo Banco Central Europeu e pelo Fundo Monetário Internacional (que, em conjunto, são conhecidos como Troika), registou-se uma diminuição drástica do nível de renovações das convenções coletivas. A cobertura caiu de cerca de 1.242.000 trabalhadores em 2011, ou seja, cerca de 53% de todos os funcionários cobertos por acordos no setor de mercado, para níveis sem precedentes de 19% em 2012 e cerca de 11% em 2013 e 2014. Desde 2015, está em curso um lento processo de recuperação, com um aumento na proporção de trabalhadores abrangidos por acordos coletivos que foram revistos ou publicados de novo: de 568.000 (25%) em 2015 para 994.000 (40%) em 2018 e 883.000 (35%) em 2019. No entanto, essa cobertura não atingiu os níveis observados antes da crise econômica global, quando 1.895.000 empregados foram cobertos por renovações de acordos coletivos, representando 65% de todos os trabalhadores cobertos por acordos (Campos Lima, 2017, 2019). O número de funcionários cobertos por renovações de acordos coletivos caiu drasticamente em 2020, o primeiro ano da pandemia, para 488.000. Em 2021, houve uma ligeira recuperação: 636.000 trabalhadores foram cobertos por renovações de acordos, ou seja, 26% da cobertura da negociação coletiva. Sendo esta a situação em vésperas da escalada da inflação, pressionou ainda mais a negociação coletiva, levando a um aumento do número de trabalhadores abrangidos por atualizações de convenções coletivas, atingindo cerca de 711.000 em 2022 (DGERT/MTSSS, 2022, 2023; GEP/MTSSS, 2022).

Cobertura da negociação coletiva salarial de empregados de diferentes fontes

Level% (year)Source

All levels

73.6 (2018)

OECD and AIAS, 2021

All levels

69 (2013)

European Company Survey 2013

All levels

56 (2019)

European Company Survey 2019

All levels

79 (2010)*

Structure of Earnings Survey 2010

All levels

87 (2014)*

Structure of Earnings Survey 2014

All levels

89 (2018)*

Structure of Earnings Survey 2018

All levels

91.4 (2011)

Quadros de Pessoal 2011, DGERT/MTSSS (2018)

All levels

89.1 (2013)

Quadros de Pessoal 2013, DGERT/MTSSS (2014)

All levels

87.5 (2016)

Quadros de Pessoal 2016, DGERT/MTSSS (2017)

All levels

86.5 (2017)

Quadros de Pessoal 2017, DGERT/MTSSS (2018)

All levels

86.2 (2018)

Quadros de Pessoal 2018, DGERT/MTSSS (2019)

All levels

85.1 (2019)

Quadros de Pessoal 2019, DGERT/MTSSS (2020)

All levels

84.2 (2020)

Quadros de Pessoal 2020, DGERT/MTSSS (2021)

All levels

84.0 (2021)

Quadros de Pessoal 2021, DGERT/MTSSS (2022)

Notas: * Porcentagem de funcionários que trabalham em unidades locais onde mais de 50% dos funcionários estão cobertos por um acordo coletivo de trabalho em relação ao número total de funcionários que participaram da pesquisa.

Fontes: Eurofound, European Company Survey 2013 e 2019 (incluindo empresas do setor privado com estabelecimentos com >10 trabalhadores (códigos B–S da Nomenclatura das Atividades Económicas (NACE)), com múltiplas respostas possíveis); Eurostat [earn_ses10_01], [earn_ses14_01], [earn_ses18_01], Inquérito à Estrutura dos Ganhos 2010, 2014 e 2018 (incluindo as empresas com >10 trabalhadores (códigos B-S da NACE, excluindo O), com uma resposta única para cada unidade local). Para mais informações sobre a metodologia, ver DGERT/MTSSS (2012–2023) e OCDE (2021).

Cobertura da negociação coletiva – dados nacionais, 2011–2021

 

2011

2012

2013

2014

2015

2016

2017

2018

2019

2020

2021

Source
Potential bargaining coverage of agreements revised in that year (in the private sector; %)

53.2

18.9

11.4

11.3

25.3

32.4

34.3

40.1

35.4

20.0

25.9

DGERT/MTSSS, Relatório sobre regulamentação coletiva de trabalho; GEP, Quadros de Pessoal

Bargaining coverage of all legally existing agreements (in the private sector; %)

91.4

89.7

89.1

88.9

88.5

87.5

86.5

86.2

85.1

84.2

84.0

DGERT/MTSSS, Relatório sobre regulamentação coletiva de trabalho; GEP, Quadros de Pessoal

Desde a criação do sistema de negociação coletiva português nas décadas de 1970 e 1980, o nível mais importante de negociação tem sido, de longe, o nível setorial ou setorial. Os acordos a este nível abrangem mais de 90% da força de trabalho total que pode ser potencialmente abrangida por todos os níveis de negociação coletiva. Não existem acordos coletivos a nível intersetorial. A negociação no nível da empresa é importante em alguns setores (como nos serviços públicos). Na prática, não existe descentralização na negociação coletiva em Portugal.

Níveis de negociação coletiva, 2022

 

National level (intersectoral)

Sectoral level

Company level

 WagesWorking timeWagesWorking timeWagesWorking time
Principal or dominant level  XX  
Important but not dominant level      
Existing level    XX

Articulação

Até 2009, os acordos de empresa só podiam ser assinados por sindicatos. Desde 2009, a negociação das empresas pode também ser conduzida por entidades não sindicais em empresas com mais de 500 trabalhadores e, desde 2012, em empresas com mais de 150 trabalhadores, embora ainda sob delegação sindical (Código do Trabalho, artigo 491.º, n.º 3, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 23/2012). No entanto, acordos desse tipo específico não foram assinados desde que a possibilidade foi estabelecida, conforme documentado no Livro Verde sobre Relações Trabalhistas de 2016 (Dray, 2017). Além disso, não há articulação significativa entre os níveis de negociação, na medida em que os acordos de empresa não estão subordinados ao quadro de acordos setoriais. Por exemplo, é possível que o sindicato que assina um determinado acordo de empresa não seja o mesmo sindicato que assinou o acordo setorial em vigor. A concorrência entre sindicatos (filiados na CGTP-IN, na UGT ou num sindicato independente) e a caducidade das convenções colectivas sectoriais contribuem para essa possibilidade. Por outro lado, a Lei 23/2012 possibilitou que as convenções coletivas incluíssem cláusulas de articulação entre níveis, mas muito poucos acordos assinados desde então incluíram esse tipo de cláusula (CRL/MTSSS, 2016, 2017, 2018, 2019, 2020, 2021).

O período entre a assinatura de um acordo e sua publicação no boletim oficial do MTSSS (Boletim do Trabalho e Emprego (BTE) pode variar de algumas semanas a alguns meses.

Há grandes variações na duração das rodadas de negociação entre setores e anos. Esta é outra fonte de dificuldade em determinar a época do ano em que as rodadas de negociação geralmente ocorrem.

A actual crise negocial e o consequente baixo número de acordos não permitem identificar padrões significativos de calendário, como era possível antes da crise.

Em geral, as rodadas de negociação ocorrem anualmente, em conexão com a negociação salarial.

As confederações sindicais acompanham as negociações setoriais e fornecem algumas orientações, mas é no nível setorial ou da federação que ocorre a coordenação com as unidades de nível inferior. Os empregadores de alto nível coordenam implicitamente as mudanças entre seus afiliados de nível inferior. Durante a primeira década de concertação tripartite em nível macro (1987-1997), a coordenação da negociação salarial assumiu a forma de acordos macroeconômicos tripartites sobre políticas de renda (Campos, Lima e Naumann, 2011). Os acordos tripartidos não vinculativos sobre o aumento do salário mínimo nacional podem ter influência nos resultados da negociação coletiva, uma vez que exercem pressão sobre os salários mais baixos das tabelas salariais existentes. Isso ocorreu durante 2008-2010 e também vem ocorrendo mais recentemente, desde 2015, porque o salário mínimo nacional após os aumentos excedeu o nível das faixas salariais mais baixas de muitos acordos coletivos. Estudos recentes destacaram essa ligação entre as políticas de salário mínimo e os desenvolvimentos da negociação coletiva (GEP/MTSSS, 2019b; Martins, 2019; Campos Lima et al, 2021).

Os acordos coletivos podem ser prorrogados por decreto emitido pelo MTSSS. Até a crise econômica, essa era uma prática generalizada em muitos setores. O Memorando de Entendimento de 2011 exigia que a extensão das convenções coletivas se baseasse na representatividade, tanto dos sindicatos quanto das associações patronais. As alterações legais em 2012 e em 2014 referiam-se apenas à representatividade/representação do empregador. Na versão de 2012, eles tiveram que representar 50% do emprego no setor, o que em muitos setores é uma meta impossível. Na versão de 2014, 30% de seus membros deveriam ser micro, pequenas e médias empresas para que pudessem prorrogar os acordos coletivos.

Essas regras foram retiradas em 2017 por uma série de razões: o impacto negativo na negociação coletiva como resultado da redução do número de prorrogações e do número de acordos coletivos atualizados, bem como sua cobertura; a fragilidade das associações patronais evidenciada pelo Livro Verde sobre as relações laborais de 2016 (Dray, 2017), com apenas 19% das empresas em Portugal em 2014 a afirmarem estar filiadas em associações patronais; e o fato de que tanto as confederações patronais quanto as confederações sindicais eram contrárias ou reticentes quanto aos critérios de extensão baseados na representatividade/representatividade. Em maio de 2017, a Resolução 82/2017 substituiu os critérios de representatividade/representação das associações patronais por novos critérios para a extensão dos acordos coletivos: o efeito sobre a massa salarial e os impactos econômicos, o nível do aumento salarial, o impacto na escala salarial e na redução da desigualdade, o percentual de trabalhadores a serem cobertos (no total e por gênero) e a proporção de mulheres que serão beneficiadas.

A Lei n.º 23/2012 estabeleceu a possibilidade de «cláusulas abertas», permitindo que as convenções coletivas especifiquem que as regras relativas à mobilidade geográfica, ao tempo de trabalho e aos salários podem ser estabelecidas por acordos a outro nível (conforme exigido pelo Memorando de Entendimento da Troica). No entanto, não foram relatados casos de acordos que incluam esse tipo de cláusula (CRL/MTSSS, 2016; GEP/MTSSS, 2017).

As derrogações em sentido estrito não eram possíveis até recentemente, mas isso mudou em agosto de 2014. A sétima revisão do Código do Trabalho introduziu a possibilidade de suspensão temporária das convenções coletivas em caso de crise grave que "afete gravemente a atividade normal da empresa". A suspensão só é possível se a(s) organização(ões) patronal(is) e sindicato(s) assinar(em) um acordo escrito para esse fim.

O Código do Trabalho de 2003 introduziu mecanismos para acelerar a rescisão de convenções coletivas e reduzir seu período de vigência após o término. Além disso, o Código do Trabalho de 2009 facilitou a «caducidade» unilateral das convenções coletivas e reduziu o seu período de sobrevivência. Em conformidade com os requisitos do Memorando de Entendimento da Troika, a legislação de 2014 reduziu ainda mais o período de validade e o período de sobrevivência. A caducidade torna-se efetiva se uma das partes signatárias 'denunciar' oficialmente o acordo, desencadeando assim o processo de caducidade. Esse processo leva pelo menos 14 meses (a partir da data da denúncia) para que o acordo seja efetivamente cancelado. Os trabalhadores abrangidos pelo acordo antes da sua caducidade guardam individualmente um conjunto de direitos estipulados no acordo, tais como a sua remuneração, categoria/função, tempo de trabalho e proteção social. As associações patronais têm sido as principais proponentes dos requisitos unilaterais para a caducidade dos acordos. As medidas legais minaram o poder sindical e a qualidade e o equilíbrio da negociação coletiva em vários setores.

O compromisso tripartido para um acordo de concertação de médio prazo assinado em janeiro de 2017 compreendeu um acordo bipartido entre confederações patronais e confederações sindicais para suspender quaisquer pedidos de caducidade por 18 meses. Embora essa iniciativa possa ter ajudado na recuperação da negociação coletiva, não foi uma solução de longo prazo, pois a medida era temporária. A CGTP-IN tem vindo a apelar à revisão do quadro legal de forma a restabelecer o princípio de que uma convenção colectiva só pode caducar quando ambas as partes signatárias concordem em fazê-lo, princípio que está enraizado no sistema de negociação colectiva desde 2003.

A Lei n.º 93/2019 que altera o Código do Trabalho, na sequência do acordo tripartido de 2018, não inverteu a possibilidade de caducidade unilateral das convenções coletivas. No entanto, introduziu várias medidas de atenuação, tais como a obrigação de o pedido escrito de caducidade de uma convenção coletiva indicar as razões económicas e estruturais ou o ajustamento inadequado da convenção coletiva (artigo 500.º), o reforço do papel do CES em matéria de arbitragem e mediação para evitar a caducidade dos acordos (artigo 501.º-A), e um alargamento do leque de direitos que os trabalhadores mantêm quando as convenções coletivas caducam, incluindo a saúde e segurança no trabalho e os direitos parentais (artigo 501.º, n.º 8). Por outro lado, esta lei acrescentou a possibilidade de caducidade das convenções colectivas em caso de extinção de uma organização signatária, sindicato ou associação patronal (artigo 502.º, n.º 1, alínea b)), medida que gerou polémica e está a ser analisada pelo Tribunal Constitucional – argumentando que esta disposição viola os direitos constitucionais da contratação colectiva, os partidos de esquerda BE, PCP e PEV, em 23 de setembro de 2019, solicitaram ao Tribunal Constitucional que examinasse esta disposição. Este exame ainda não foi concluído.

Em março de 2021, em resposta à crise da negociação coletiva em 2020, no contexto da pandemia, o governo suspendeu os prazos relativos à caducidade das convenções coletivas por um período de 24 meses (Lei 11/2021) para evitar a erosão da cobertura da negociação coletiva (Eurofound, 2022).

De acordo com o Código do Trabalho (artigo 542.º), as convenções coletivas podem incluir regras sobre cláusulas de paz que determinam a paz industrial durante a vigência de uma convenção coletiva, mas as cláusulas de paz nas convenções coletivas são extremamente raras.

Os acordos coletivos abrangem um grande número de questões, mas, nos últimos anos, a negociação coletiva deu prioridade à negociação salarial e à flexibilidade do tempo de trabalho. Os regulamentos relativos às contas de tempo de trabalho (banco de horas) e outras formas de flexibilidade do tempo de trabalho foram abordados em várias convenções coletivas (CRL/MTSSS, 2016, 2017, 2018, 2019). Relatórios recentes também destacaram disposições relativas aos desafios da economia digital (Ramalho, 2019).

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